TRF2 confirma nulidade da patente referente ao medicamento Crestor
Colegiado considerou ausente o requisito legal de atividade inventiva
Puclicado por: Tribunal Regional Federal da 2a Região – DF
Em: 16/08/2017
No julgamento realizado na última segunda-feira, dia 14, em sessão estendida, a 2ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) confirmou a sentença que havia decretado a nulidade da patente de invenção PI 0003364-2, por falta de atividade inventiva, um dos requisitos para que o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) conceda um registro, conforme previsto no artigo 8º da Lei de Propriedade Industrial* (LPI).
As composições farmacêuticas protegidas pela patente anulada compreendem a estatina rosuvastatina cálcica e o seu agente estabilizador, fosfato tribásico de cálcio, com cátion multivalente, utilizados no medicamento “Crestor” para o tratamento de altos níveis de gordura no sangue, principalmente colesterol e triglicerídeos.
O registro havia sido requerido pela empresa biofarmacêutica Astrazeneca AB, mas foi questionado pela Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos (Pro Genéricos), pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pela Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas especialidades (Abifina) e pela EMS – multinacional brasileira de produtos farmacêuticos.
Inconformada com a sentença da juíza federal Marcia Maria Nunes de Barros, a Astrazeneca recorreu ao TRF2, sustentando que a magistrada de 1º grau, ao desenvolver uma inédita metodologia para a análise da obviedade e aplicá-la ao caso – “que trata de questões de natureza eminentemente técnica e de extrema complexidade”–, colocou-se na posição de um “técnico no assunto”, sem possuir o “conhecimento corrente na área técnica apreciada”. Afirmou ainda que a juíza deveria ter fundamentado sua decisão “no laudo pericial ou nos pareceres técnicos apresentados pelas partes ao longo da demanda”.
Entretanto, no TRF2, prevaleceu a tese firmada no voto-vista da desembargadora federal Simone Schreiber, no sentido de que falta atividade inventiva à referida patente, que deve ser declarada nula, conforme previsto no artigo 46 da LPI**. “O emprego de estatinas para o controle de triglicerídeos e colesterol, incluída a rosuvastatina, pertence ao domínio público, de modo que as patentes que versam sobre esta matéria consistem em invenções meramente incrementais”, pontuou.
De acordo com a desembargadora, “um técnico no assunto, entendido como alguém dotado de capacidade mediana de investigação e experimentação, com acesso aos meios necessários a realizar testes rotineiros, certamente estaria motivado a testar o emprego do fosfato tribásico de cálcio de cátion multivalente, para estabilizar a rosuvastatina, com razoável expectativa de sucesso”.
Quanto à validade do teste de obviedade – nomeado pelo Juízo de 1º grau como Teste de Motivação Criativa (TMC) – utilizado como metodologia para a aferição do requisito de atividade inventiva, para Simone Schreiber, trata-se de um parâmetro válido, “oferecendo um método de apuração objetivo e criterioso, de modo a dar efetividade ao princípio da segurança jurídica na análise do requisito de atividade inventiva”.
“Na hipótese dos autos, ao fundamentar a sua metodologia para verificação de atividade inventiva, a juíza empreendeu um esforço louvável de explicitar aquilo que poderia ter feito internamente. A juíza trouxe parâmetros objetivos para a aferição da atividade inventiva, o que, longe de surpreender as partes, traz segurança jurídica, facilitando inclusive o posterior reexame por parte do Tribunal, em sede de eventual apelação”, pontuou a desembargadora.
No voto – que foi acompanhado pelos desembargadores Marcello Granado, Abel Gomes e pelo juiz federal convocado Theophilo Miguel – Simone Schreiber afirmou que, ao contrário do que alega a Astrazeneca, a magistrada não ignorou a prova técnica, “tão somente lançou mão de conceitos jurídicos, buscando subsídios na LPI, nas Diretrizes de Exame do INPI e na experiência internacional”.
“A juíza deferiu a prova pericial, que foi produzida regularmente; o laudo do perito do juízo foi submetido ao contraditório e debatido amplamente pelas partes, que tiveram oportunidade de juntar pareceres técnicos convergentes e divergentes com o laudo; e enfim o perito foi instado a esclarecer dúvidas e se posicionar sobre as impugnações feitas a seu laudo. Todas essas manifestações técnicas foram exaustivamente analisadas pela juíza na sentença e a sua conclusão foi no mesmo sentido de posicionamentos técnicos existentes nos autos”, finalizou Simone Schreiber.
Processo: 0802461-54.2011.4.02.5101
*Art. 8º É patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.
** Art. 46. É nula a patente concedida contrariando as disposições desta Lei.
Ver original: http://www10.trf2.jus.br/portal/trf2-confirma-nulidade-da-patente-referente-ao-medicamento-crestor/